Mesa da DPRJ na COP30 evidencia como raça, gênero e território definem quem mais sofre com enchentes, deslizamentos e a ausência de políticas públicas

No último sábado, 15 de novembro, a Green Zone da COP30 recebeu um debate urgente e revelador. A mesa “Mulheres, Territórios e Justiça Climática: respostas do Rio para a crise ambiental” reuniu lideranças da sociedade civil e representantes da Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro (DPRJ) para discutir uma realidade incontornável: a crise climática tem cor, gênero e território. Em um país onde eventos extremos se repetem com intensidade crescente, destacou-se que são principalmente as mulheres negras e periféricas que suportam, de forma desproporcional, o peso das enchentes, dos deslizamentos e da ausência de políticas públicas eficazes.

Logo na abertura, representantes da DPRJ reforçaram que discutir clima é, também, discutir direitos das mulheres. Isso porque, além de sentirem com mais força os impactos da falta de água, da insegurança alimentar e dos desastres ambientais, são elas que sustentam redes de cuidado, articulam respostas comunitárias e garantem a sobrevivência dos territórios até que o poder público chegue.

A fundadora do Instituto Todos Juntos, Ninguém Sozinho (TJNS), Pâmela Mércia, trouxe uma análise sobre como a história de Petrópolis estrutura desigualdades que tornam o município um marco das tragédias climáticas no Brasil. Ela explicou que a ocupação do território — marcada pela dizimação de povos indígenas e pelo deslocamento forçado de populações negras para áreas de risco — é a base das vulnerabilidades atuais. Um município que exibe suas belezas arquitetônicas, mas que, todos os verões, estampa manchetes em razão de desastres que atingem sobretudo a população negra e periférica.

— Petrópolis, para além de vender as suas belezas arquitetônicas, em cada verão ganha o cenário de mídia por conta das tragédias climáticas. Isso é algo histórico. E a população negra foi empurrada justamente para as áreas que hoje são consideradas áreas de risco — afirmou Pâmela.

A fala conectou passado e presente ao mostrar como a lógica de ocupação urbana determina quem mais sofre com enchentes, deslizamentos e ondas de calor. A partir daí, o debate avançou para a escala metropolitana com a exposição de Paola Lima, Coordenadora de Mobilização da Casa Fluminense.

Paola destacou que as desigualdades climáticas na Região Metropolitana do Rio resultam de escolhas políticas que historicamente privilegiam determinadas áreas enquanto deixam outras à margem. Segundo ela, falar em justiça climática é reconhecer que existe um sistema que produz injustiça e que determina quem recebe infraestrutura, proteção e investimentos.

— Se a gente pede justiça climática é porque existe algum esquema que é injusto. Existe um território que sofre mais, existe uma cor — que é a cor negra — e existe também um gênero, que são as mulheres. Mulheres negras de favelas e periferias são as que mais sofrem com os impactos das mudanças climáticas — disse Paola.

A Defensora Pública Thaís Lima, Coordenadora de defesa dos direitos da mulher da DPRJ, trouxe a dimensão jurídica e de direitos das mulheres para o centro da discussão. Thaís destacou que a combinação entre desigualdade estrutural e intensificação dos eventos extremos aumenta riscos de violência doméstica, insegurança econômica e sobrecarga de cuidado, ampliando vulnerabilidades já existentes.

— O aumento da frequência e da intensidade dos eventos climáticos extremos afeta de maneiras diferentes um Brasil múltiplo, onde algumas regiões enfrentam seca e calor e outras convivem com frio extremo. Esse contexto de desigualdade estrutural torna as mulheres mais expostas a essas adversidades. Mulheres em situação de maior vulnerabilidade econômica e social também tendem a contar com menos ferramentas e menos renda para enfrentar os impactos da mudança climática — enfatizou a Defensora.

Além de mapear desafios, a mesa apresentou iniciativas concretas. Pâmela detalhou a atuação do Instituto TJNS e soluções baseadas na natureza desenvolvidas em Petrópolis. Paola explicou como o Painel Climático da Casa Fluminense evidencia desigualdades históricas e pressiona municípios por planejamento responsável. Já a Defensora Thaís apresentou casos acompanhados pela Defensoria em cenários de desastre, reforçando a importância de políticas públicas que protejam mulheres antes, durante e após eventos extremos.

O debate também contou com a participação do Defensor Público Lucas Nunes, do 8° Núcleo Regional de Tutela Coletiva da DPRJ, que mediou a mesa e apresentou caminhos institucionais para o litígio climático no estado. Lucas destacou desafios e avanços da atuação coletiva da Defensoria, ressaltando a necessidade de integrar esforços entre sociedade civil, poder público e órgãos de justiça para enfrentar violações que atravessam gerações.

Texto: Melissa Cannabrava



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