Carlos Vitor é um homem negro de cabelo crespo com tranças nagô na parte frontal. Ele veste jaqueta jeans azul com uma blusa branca por baixo e está com um semblante concentrado pois exibe o canudo referente a um diploma que recebeu
Carlos Vitor (foto: acervo da família)


A pedido da Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) concedeu habeas corpus para Carlos Vitor Guimarães nesta segunda-feira (23). O jovem foi condenado e cumpria pena de 8 anos, 10 meses e 20 dias de reclusão, após ter sua fotografia incluída e exposta no álbum de suspeitos de uma delegacia em São Gonçalo e, a partir disso, ter sido apontado como suspeito de roubo de carga. O STJ determinou a anulação do reconhecimento fotográfico e de todas as provas derivadas dele, levando à consequente absolvição de Carlos Vitor.

Em 2018, Carlos teve seus documentos roubados em São Gonçalo durante um evento. A polícia encontrou a identidade roubada em posse de acusados de roubos de motos, então convocou Carlos a prestar esclarecimentos. Foi constatado que ele era vítima do roubo. Não se sabe como a imagem de Carlos Vitor foi inserida em álbum de suspeitos da polícia. 

Por meio de reconhecimento fotográfico feito na delegacia, a vítima de um roubo de carga indicou o jovem como um dos autores do crime e, quando ouvido em Juízo, destacou o cabelo estilo ‘black power’ como característica marcante. Na época do crime, no entanto, Carlos Vitor usava tranças longas. E, embora a vítima tenha demonstrado dúvida durante o reconhecimento feito  na audiência judicial ocorrida em novembro de 2020, Carlos Vitor foi condenado de forma definitiva em outubro de 2021.

 Ele está preso desde fevereiro de 2023, e a partir desta época passou a ser defendido pela DPRJ, que fez um pedido de revisão criminal perante o TJRJ, porém foi negado, e, posteriormente, através de habeas corpus perante o STJ teve o pedido de liberdade e a invalidação da prova do reconhecimento concedidos, durante esta semana. 

A coordenadora de Defesa Criminal da DPRJ, Lúcia Helena de Oliveira, reitera que o uso inadequado do reconhecimento fotográfico, reconhecido neste processo pelo STJ, vitimiza pessoas inocentes, sobretudo negras:

— Este caso é mais um dos tristes exemplos de equívocos em reconhecimento de pessoas, que levam inocentes, em muitos casos, ao cárcere. O reconhecimento de pessoas deve ser realizado de forma cuidadosa e com respeito às garantias constitucionais e processuais, sob pena de violações de direitos e prisões injustas, conforme demonstrado, por algumas vezes, através das pesquisas da Defensoria Pública. Sabemos da seletividade penal que acaba envolvendo majoritariamente pessoas negras, sobretudo nos casos de reconhecimento fotográfico, o que exige de todos os atores do sistema de justiça um olhar bastante atento para que possamos preservar direitos constitucionais — comenta a defensora Lúcia Helena de Oliveira.

Na decisão, o desembargador Otávio de Almeida Toledo ressalta que o reconhecimento fotográfico “não pode servir como prova em ação penal, ainda que confirmado em Juízo”. Além disso, Toledo questiona a forma como o procedimento foi utilizado no caso e, portanto, ordena que a anulação do reconhecimento fotográfico seja decretada.

Com a anulação da prova baseada no reconhecimento fotográfico, a decisão do Superior Tribunal de Justiça concede liberdade imediata a Carlos Vitor, além da absolvição no processo.

Texto: Nathalia Braga



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