Núcleo de Defesa dos Direitos Humanos pediu à Justiça que obrigue Estado e Município a darem informação sobre interrupção de aulas e suspensão de atendimento médico

 

O Núcleo de Defesa dos Direitos Humanos (Nudedh) da Defensoria Pública do Rio solicitou, na última sexta-feira (20), à Justiça que encaminhe ofícios às Secretarias estadual e municipal de Educação e de Saúde, para esclarecimentos sobre os prejuízos causados por operações policiais no Complexo da Maré. O Nudedh quer reunir dados quanto ao impacto da violência sobre os estudantes e sobre a saúde mental dos moradores do conjunto de favelas da Maré, onde, apenas entre 9 e 18 de outubro, houve sete dias úteis de incursões de forças de segurança. 

“Além da participação das Polícias Civil e Militar do Estado do Rio de Janeiro, as ações de repressão ao crime no território em questão passaram a ser reforçadas por agentes da Força Nacional de Segurança Pública, da Polícia Rodoviária Federal e da Polícia Federal”, o que “vêm provocando a suspensão na prestação de serviços essenciais como funcionamento de escolas e postos de saúde”, destaca o pedido de cumprimento provisório de tutela de urgência apresentado pelo Nudedh. 

Na quinta-feira (26), a coordenação do núcleo e 16 associações de moradores da Maré irão se reunir com o prefeito Eduardo Paes para discutir a interrupção de serviços públicos municipais por conta de operações policiais.   Nesta quarta (25), o Nudedh e as entidades participaram de encontro com representantes de nove ministérios que podem integrar ações, coordenadas pela Secretaria Nacional de Diálogos Sociais e Articulação de Políticas Públicas da Secretaria-Geral da Presidência da República, para atender a demandas da população da comunidade para promoção de direitos em diferentes áreas.  

Na terça-feira (17), o Nudedh já havia acompanhado a Redes da Maré em agenda em Brasília, com o secretário-executivo do Ministério da Justiça, Ricardo Capelli, para tratar mais especificamente de incursões das forças de segurança no território. 

O ajuizamento da última sexta-feira foi feito no bojo de ação civil pública que tramita na 6ª Vara de Fazenda Pública desde 2015 (a chamada ACP da Maré) com o objetivo de conter violações de direitos durante operações, e que já levou à decisão liminar, confirmada pela 2ª Câmara Cível, determinando, entre outras providências, que as secretarias de Polícia Militar e de  Polícia Civil informem previamente a autoridades de educação e de saúde, bem como o Ministério Pública, sobre operações naquele território.  

Dentre os questionamentos que o Nudedh faz às secretarias de educação e de saúde está exatamente que confirmem se “foram comunicadas sobre a realização das operações em tempo hábil, possibilitando a adoção de medidas para preservar a vida e integridade física” dos estudantes e dos usuários dos serviços médicos oferecidos na Maré. 

Da educação, a coordenação do núcleo quer saber se foram baseadas viaturas policiais nas entradas e nas proximidades de escolas; se as operações policiais aconteceram em horário de entrada e saída de alunos; por quantos dias as aulas e quantas crianças e adolescentes foram afetado; e se há plano de reposição dos dias letivos.

Da saúde, os pedidos são relativos à presença de viaturas nas imediações das unidades de atendimento; quais serviços e postos foram afetados; quantos usuários prejudicados; planos de reagendamento de atendimentos suspensos; e, especificamente, se há informações quanto ao “impacto da violência sobre a saúde mental dos moradores do conjunto de favelas da Maré”.

Estimativas alarmantes

O texto ressalta ainda: “Estima-se que o dia 16 de outubro, 41 escolas municipais e 4 escolas estaduais tiveram suas atividades suspensas, afetando mais de 13 mil alunos”. Segundo o Nudedh, apesar de alarmantes, “é certo que os números levantados estão subestimados”. Há notícias de que “só em 2023, dos 208 dias letivos previstos nas Unidades Escolares Municipais, os estudantes da Maré já perderam cerca de 9% delas por conta de violência e operações policiais, sem qualquer previsão de reposição”.   Também a Universidade Federal do Rio de Janeiro teve aulas suspensas pelo mesmo motivo.   

Informações fornecidas por entidades de moradores da Maré ao Nudedh dão conta de que “três clínicas de família (Augusto Boal, Adib Jatene e Jeremias Moraes da Silva) e um centro de saúde (Centro Municipal de Saúde Vila do João) acionaram o ‘protocolo de acesso seguro’, suspendendo totalmente o funcionamento dessas unidades. Além disso, a Clínica da Família Diniz Batista dos Santos também teria interrompido todas as suas atividades externas, bem como teria havido prejuízo a pessoas com necessidades de tratamentos específicos em saúde mental, também suspensos. 

“O Espaço Normal, instituto responsável por acolher pessoas em situação de rua ou dependentes químicas, foi outro estabelecimento impactado com a suspensão dos seus mais de 100 atendimentos diários por conta da insegurança causada pela operação”, ressalta o Nudedh. 

Por fim, também foi afetado o funcionamento do Prato Feito Carioca, projeto da Prefeitura do Rio inaugurado uma semana antes do início das operações. “As atividades foram suspensas, paralisando a entrega de cerca de 280 refeições diárias para moradores em situação de extrema vulnerabilidade social, contribuindo ainda mais para a insegurança alimentar da população do complexo de favelas da Maré”, salienta a petição. 

O Nudedh menciona ainda que durante recente operação da Polícia Federal na Barra da Tijuca, durante a qual foram apreendidos 47 fuzis, os vizinhos “não foram importunados, seus filhos não perderam aulas e atendimento médico, demonstrando que ações de alta eficácia no combate ao crime organizado podem ser feita sem prejuízo aos direitos dos moradores”. Da mesma forma, outra operação da PF, no último dia 19, para a prisão de policiais civis e um advogado envolvidos em corrupção e tráfico de 16 toneladas de maconha, ocorreu sem violência.



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