Seis em cada dez inquéritos policiais sobre mortes de crianças e adolescentes no Estado do Rio de Janeiro aguardam conclusão, alguns há mais de duas décadas. Do total de 15.614 casos registrados desde 1999, há hoje 9.428 à espera de solução. Em média, as investigações que ainda estão em aberto se arrastam por 9 anos e 8 meses.
Os dados são parte do II Relatório sobre inquéritos de homicídio praticados contra crianças e adolescentes, produzido pela Defensoria Pública do Rio (DPRJ) para verificar a aplicação da Lei Ágatha, de 2021, que determina prioridade à investigação desses crimes. A lei leva o nome da menina morta por um tiro de fuzil durante operação policial no Complexo do Alemão, no município do Rio.
O levantamento da Diretoria de Estudos e Pesquisas de Acesso à Justiça da Defensoria teve por base informações fornecidas pela Secretaria de Polícia Civil e pelo Instituto de Segurança Pública sobre crimes de homicídio – culposos e dolosos, tentados e consumados - contra pessoas de 0 a 17 anos. O trabalho confirmou o que já fora constatado no I Relatório sobre o assunto, divulgado em dezembro de 2021, e segundo o qual havia em aberto, na época, 9.542 casos de homicídios nessa faixa etária em todo o Estado, levando, em média, 8 anos e 3 meses até a conclusão.
— A média dessa vez ficou em 7 anos e 8 meses, um pouco abaixo da calculada no relatório anterior, muito provavelmente porque agora tivemos acesso também aos inquéritos concluídos. Se considerado apenas o tempo de tramitação dos inquéritos em aberto, a média de aproximadamente 9 anos e 8 meses é ainda maior do que a calculada no primeiro levantamento. Fica evidente que a Lei Ágatha não impactou positivamente a duração dos inquéritos que investigam mortes de adolescentes e crianças — reforça a diretora de pesquisas da Defensoria, Carolina Haber.
Dentre os 15.614 inquéritos analisados (os 9.428 ainda em aberto e os 6.186 concluídos), os crimes dolosos (intencionais) equivalem à quase metade, representando exatos 47,6% do total. Dentre os homicídios em geral, prevalecem aqueles com uso de arma de fogo, que correspondem a 32% do total de inquéritos de homicídio consumado (4.988 de 15.614) e a 46% se considerados também homicídios tentados (7.228 de 15.614).
A maior parte das vítimas dos crimes dolosos têm entre 12 e 17 anos de idade. Nessa faixa etária estão 94% de meninos e meninas atingidos pela modalidade consumada (4.694 de 4.988 casos) e 91% se considerada também a tentada (6.591 de 7.228 ocorrências).
— O longo tempo de tramitação dessas investigações prolonga o luto das famílias e gera uma sensação de impunidade. É preciso avançar na prevenção dessas mortes, e a responsabilização efetiva é um dos caminhos a serem trilhados — destaca o defensor público Rodrigo Azambuja, coordenador de Infância e Juventude.
Vítimas de atividade policial
O II Relatório traz dados específicos sobre os inquéritos de homicídios consumados ou tentados decorrentes de atividade policial, categoria em que se enquadra o caso de Ágatha Félix. Dentre os ainda não concluídos, há “784 ocorrências, das quais 25 são tentativas, que representam 8,31% (784 de 9.428) dos homicídios cujos inquéritos estão abertos e 5% (784 de 15.614) do total de inquéritos”.
Nesses casos ainda em aberto, “o tempo médio de duração dos inquéritos do conjunto de delitos agrupados como relativos à atividade policial é de aproximadamente 10 anos e meio”, podendo chegar a 16 anos no caso dos homicídios dolosos consumados classificados com auto de resistência.
Quanto aos inquéritos já encerrados e que apuravam homicídios de crianças e adolescentes decorrentes de intervenção policial, oposição à intervenção policial e auto de resistência, em suas formas consumadas ou tentadas, foram analisadas 409 ocorrências, das quais sete são tentativas, que representam 6,61% dos homicídios com apuração concluída (409 de 6.186).
O tempo médio de duração dos inquéritos do conjunto de delitos agrupados como relativos à atividade policial é de aproximadamente cinco anos para as investigações encerradas.
Acesse aqui a íntegra do II Relatório
Texto: Valéria Rodrigues