Falta de medicamento para portadores de diabetes e de fórmula nutricional para crianças alérgicas a leite de vaca leva ao ingresso de ações judiciais individuais.

A Defensoria Pública do Rio (DPRJ) e a Defensoria Pública da União (DPU) encaminharam aos governos federal, estadual e municipal recomendações conjuntas que visam garantir o fornecimento regular pelo Sistema Único de Saúde (SUS) de insulina para pessoas portadoras de diabetes mellitus do tipo 1 e de fórmula nutricional para crianças de até dois anos de idade alérgicas ao leite de vaca.  O desabastecimento desses dois itens tem sido responsável por grande parte das ações judiciais individuais ingressadas pela Defensoria no âmbito da saúde.

De janeiro a abril desse ano, 112 pessoas procuraram a Defensoria Pública do Estado para tentar assegurar acesso à insulina conforme prescrição médica. No mesmo período, 40 mães e pais de crianças de zero a 24 meses intolerantes à proteína do leite de vaca buscaram a Defensoria para garantir fórmula nutricional alternativa.  

No ano passado, foram 387 casos levados à Justiça pela DPRJ, em todo o Estado do Rio de Janeiro, com pedido de insulina. Para fórmula nutricional, foram 105 ações em 2022. Os dados referem-se apenas a demandas recebidas pelos Núcleos de Primeiro Atendimento da instituição que contam com Câmaras de Resolução de Litígios de Saúde (CRLS). 

Os documentos enviados ao Ministério da Saúde, à secretaria estadual de Saúde e à secretaria de Saúde do município do Rio, em 15 de maio, estabelecem o que deve ser feito para regularizar o fluxo de distribuição de insulina e de fórmula nutricional a todos os adultos e crianças que delas dependem e determinam, inclusive, prazos para prestação de informações sobre as providências adotadas.  

— São recomendações importantes que objetivam regularizar o fornecimento destes dois produtos de interesse à saúde que são intensamente judicializados e que constituem demandas repetitivas da tutela individual. Trata-se de relevante estratégia que vem sendo utilizada desde 2015, com a interiorização das Câmaras de Resolução de Litígios de Saúde, utilizando a demanda individual como indicador da atuação coletiva voltada à construção de políticas públicas — explica a coordenadora de Saúde da DPRJ, Thaísa Guerreiro.

Assinam as recomendações, pela Defensoria do Rio, também a subcoordenadora de Saúde, Alessandra Nascimento, e a coordenadora do Núcleo de Fazenda, Samantha Monteiro de Oliveira. A defensora federal Shelley Duarte Maia assina pela DPU. 

Insulina de ação prolongada

A recomendação relativa à falta de insulina no SUS menciona especificamente a chamada insulina análoga de ação prolongada. Dos 112 pedidos registrados de janeiro a abril desse ano para insulina, 80 foram para a prolongada; os demais foram relativos à de ação rápida.  A insulina análoga de ação prolongada já está incorporada à lista de medicamentos essenciais para o controle de diabetes mellitus do tipo 1 e, portanto, deveria fazer parte do fluxo de distribuição aos pacientes de maneira administrativa, sem necessidade de ação judicial.

Por isso, as defensoras públicas determinaram que União, Estado e Município do Rio têm até 15 de junho para organizar a distribuição da insulina prolongada. Os três entes devem, a partir de então, enviar às Defensorias informações atualizadas sobre a regularização do abastecimento da insulina análoga de ação prolongada.

Além disso, o Ministério da Saúde deve informar as medidas já tomadas para aquisição do produto e, havendo demora na compra, auxiliar “técnica e financeiramente o Estado e o Município na referida aquisição, em quantidade adequada aos pacientes domiciliados no Estado do Rio de Janeiro, responsabilizando-se pelo ressarcimento”. Nesse caso, cabe às secretarias estadual e municipal de Saúde, então, providenciar o quanto antes o fornecimento da insulina análoga de ação prolongada. 

Fórmula nutricional

A outra recomendação conjunta da DPRJ e da DPU destaca que o SUS já incorporou “as fórmulas nutricionais à base de soja, à base de proteína extensamente hidrolisada com ou sem lactose e à base de aminoácidos para crianças de 0 a 24 meses com alergia à proteína do leite de Vaca (APLV)”.

No entanto, ressaltam as Defensorias, “não há data prevista para o início do fornecimento administrativo das respectivas fórmulas em razão da demora na publicação do Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas da Alergia à Proteína do Leite de Vaca (PCDT), do estabelecimento das responsabilidades pelo financiamento, aquisição e distribuição, além dos fluxos para a solicitação, dispensação e forma de distribuição”.

Para sanar a pendência, a União tem 30 dias para publicar o PCDT, segundo a recomendação das Defensorias, a qual estipula ainda que a União, em até 60 dias, tome as medidas necessárias para definir responsabilidades quanto à aquisição e a financiamentos das fórmulas. 

— Foram muitas as incorporações de medicamentos importantes nos últimos cinco anos que não vieram acompanhadas da celeridade necessária para o fornecimento à população, o que precisa ser corrigido, pois esses pacientes não podem esperar — aponta a coordenadora do Núcleo de Fazenda Pública da Defensoria, Samantha Monteiro de Oliveira, que atua na Câmara de Resolução de Litígios de Saúde.

União, Estado e Município do Rio têm também 60 dias para anunciar “os fluxos para a solicitação, dispensação e forma de distribuição das fórmulas nutricionais para crianças de 0 a 24 meses com alergia à proteína do leite de vaca”. Na eventualidade de demora na definição do fluxo pelo Ministério da Saúde, este deverá auxiliar as secretarias estadual e municipal a adquirir fórmula “em quantidade adequada aos pacientes domiciliados no Estado do Rio de Janeiro, responsabilizando-se pelo ressarcimento”. 

As Defensorias advertem que a omissão da União, do Estado e do Município em atender as recomendações podem levar à adoção de “medidas administrativas e judiciais cabíveis, inclusive a propositura da ação civil pública e, sobretudo, de petição junto à Comissão Interamericana de Direitos Humanos”.



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