Ações penais foram todas baseadas em reconhecimento fotográfico falho


O Superior Tribunal de Justiça (STJ) determinou a soltura imediata de Paulo Alberto da Silva Costa, acusado em mais de 60 processos baseados em reconhecimento fotográfico. A decisão foi tomada na tarde desta terça-feira (10) pela Terceira Seção do órgão, ao julgar habeas corpus (HC) feito pela Defensoria Pública do Rio de Janeiro. A Coordenação de Defesa Criminal da DPRJ atuou em parceria com o Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD) na análise das ações penais do réu. 

Homem negro, de 35 anos, Paulo Roberto está preso na Cadeia Pública José Antonio da Costa Barros, no Complexo de Gericinó, desde março de 2020. No julgamento de hoje, os ministros entenderam que as ações foram baseadas apenas no reconhecimento fotográfico falho e chegaram a mencionar o racismo. A Defensoria aguarda que a decisão seja formalmente comunicada pelo STJ para, então, proceder os trâmites da soltura, que deve ocorrer nos próximos dias.

 
Devido à grande quantidade de acusações, a DPRJ impetrou vários pedidos de habeas corpus, que foram distribuídos a diferentes relatores no STJ, componentes da Quinta e da Sexta Turma. Diante disso, a ministra Laurita Vaz, relatora do HC 769.783, apontou a necessidade de que todos os habeas corpus fossem analisados em conjunto pelos membros da Terceira Seção, para que se tivesse uma decisão uniforme sobre eles. 


Alguns dados do estudo conduzido pelo IDDD sobre o caso merecem destaque. Com mais de 60 processos analisados, em nenhum deles Paulo foi ouvido em sede policial. A conclusão sobre a autoria no inquérito policial se dá, em todos as ocasiões, por meio do reconhecimento realizado por fotografia. Em pelo menos dois casos, foi identificado nos autos do próprio inquérito policial que o reconhecimento se deu a partir da visualização de fotografia de Paulo Alberto em um mural de suspeitos que se localizava na entrada da 54ª Delegacia de Polícia. Em todos os demais, o reconhecimento se deu pela apresentação de fotografias de redes sociais (Facebook), selfies ou fotografias de origem desconhecida. Ambas as práticas são condenadas em razão de se tratar de procedimento indutivo com alto potencial de acarretar em falsas memórias.


- Em todos os 62 processos de Paulo, os reconhecimentos são repletos de inconsistências e estão marcados pelo viés racial. Ainda assim, a polícia os considerou suficientes para levar ao pronto encerramento das investigações. O reconhecimento fotográfico é utilizado frequentemente em delegacias, por isso, temos certeza de que muitas pessoas estão passando pelas mesmas injustiças que Paulo. E o STJ pode contribuir para começar a mudar essas histórias. - aponta Guilherme Ziliani Carnelós, presidente da diretoria do IDDD.


Não há nenhuma informação oficial nos autos dos inquéritos policiais que indiquem o motivo pelo qual Paulo Alberto da Silva Costa, que não tinha sequer uma passagem pela polícia e nunca foi preso em flagrante delito, tornou-se suspeito da prática de crimes patrimoniais na região daquela delegacia.


A coordenadora de defesa criminal da DPRJ, defensora Lucia Helena Barros, lembra que pesquisas recentes da Defensoria apontaram que oito em cada dez presos injustamente por reconhecimento fotográfico são negros. 


- Os casos de erros em reconhecimento fotográfico acabam provocando prisões e/ou condenações injustas, além de reforçarem a seletividade de nosso sistema penal. É necessário um esforço conjunto de todos que atuam no processo penal para se evitar injustiças, que acabam culminando com prejuízos irreparáveis à pessoa condenada, familiares e, também, à sociedade. A decisão do STJ em muito contribuirá no reconhecimento de pessoas no Brasil, que vem causando injustiças em razão de constantes erros judiciários nas condenações. -  disse a coordenadora.



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