Defensor André Bernardes realizando o atendimento de Dione

 

Todas às quintas-feiras, Dione Conceição Neves levanta da cama e faz uma prece silenciosa para ter forças durante o dia. Moradora da Ilha Grande e mãe solteira de uma criança tetraplégica, a dona de casa, semanalmente, tem que percorrer uma trilha de mais de meia hora pela mata carregando a filha no colo até um pequeno barco que leva as duas até Angra dos Reis, onde a pequena Thandara, de 10 anos, faz as sessões de fisioterapia fornecidas pelo governo. 

Sem emprego e tendo que se dedicar aos cuidados diários com seus quatro filhos, Dione garante a subsistência de sua família  plantando alguns legumes e frutas no quintal da pequena casa que divide com os pais e o irmão. Afastada do continente e acometida por uma vida de muita luta, a dona de casa pouco sabia sobre os direitos que poderiam garantir uma vida mais confortável não só para Thandara, mas para  toda a família que vive em situação de vulnerabilidade social. 

A história de Dione encontrou com os caminhos da Defensoria Pública do Rio no último sábado (11), quando a Instituição foi até a praia de Provetá realizar a primeira parada deste ano do projeto “Defensoria nas Ilhas”, que leva atendimento jurídico aos locais mais remotos do Estado. Assim que souberam do caso da dona de casa, defensoras e defensores públicos logo se disponibilizaram a fazer a caminhada e realizar o atendimento da família. 

 

Foto: Entrada da casa de Dione/ Trilha para chegar na casa

 

Sem sofá na residência, o atendimento foi feito no quarto da própria Dione, onde a mesma relatou para o defensor público André Bernardes que Thandara ficou tetraplégica por conta de um erro médico durante o parto, realizado no  Hospital Santa Casa, em Angra dos Reis.

— A gente sofre muito, né? Saber que a minha filha poderia estar saudável, eu penso nisso todas as noites. Só uma mãe sabe como é ver um filho nesta situação. É muita luta, a gente desce carregando ela nas costas na esperança de trazer alguma melhora. É realmente difícil, semana passada estava chovendo e eu caí com ela no colo, não sei nem como vou fazer para levá-la na fisioterapia essa semana — relata a dona de casa.

Segundo o defensor André Bernardes, a pequena Thandara tem diversas demandas a serem atendidas como cadeira de rodas, cadeira para banho, além do direito a um atendimento médico que atenda melhor às necessidades da criança. 

— Encontramos essa família em situação de bastante vulnerabilidade social. Hoje a gente promoveu na casa dela um ação de obrigação de dar, para que o Município possa oferecer esses itens que já tinham sido prescritos pelo médico. Nós já colocamos as outras demandas como urgentes para que possamos fazer isso o mais rápido possível. Buscar medidas judiciais que tentem apará-la melhor — explicou Bernardes.

 

Falta de luz e descaso com escola e posto médico

Durante todo o dia 11, a Defensoria Pública atendeu mais de 90 moradores e realizou uma escuta ativa sobre os principais problemas relatados pela população local. Afastada de Angra dos Reis, a Praia de Provetá abriga mais de mil moradoras(es), que relatam a falta de energia elétrica, sinal de telefone e internet, além do abandono do poder público em relação à saúde e à educação.

— Minha televisão e a minha máquina de lavar roupas queimaram no domingo por causa dos picos de energia. Todo mundo aqui de Provetá sofre com isso, semana passada a geladeira do meu genro também queimou. Eu não tenho dinheiro para comprar outra máquina e já não consigo mais lavar roupa na mão, eu não tenho nem força no braço para isso — relata Dona Neves, de 70 anos.

 

Foto: Posto de saúde com as paredes cheias de mofo

 

No decorrer da ação, os defensores e defensoras também realizaram uma vistoria na escola e no posto de atendimento da praia com o objetivo de identificar possíveis demandas. Nos dois locais, foi constatada a necessidade de reformas devido ao mofo nas paredes.

— A gente já pediu para a prefeitura fazer obras, mas o problema continua. A única coisa que eles fazem é vir aqui e cobrir as paredes de tinta, mas o mofo continua. Quem sofre com isso são as crianças, muitas acabam tendo problemas respiratórios  — relata Márcia, que preferiu não se identificar.

De acordo com a defensora pública Marcia Cristina Pereira, após cada visita, serão feitos relatórios para encaminhamento aos Núcleos de Tutela Coletiva e atendimento das questões apresentadas pelos moradores de cada localidade. Ao todo, o “Defensoria nas Ilhas” contará com 10 ações em 2023, entre fevereiro e novembro. Itacuruçá, Paraty e Mangaratiba são os outros locais da Costa Verde que receberão atendimentos ao longo do ano. 

— O Defensoria nas Ilhas vai muito além da prestação de orientação jurídica. Na verdade, o projeto tem como finalidade resgatar e resguardar a dignidade humana para populações que residem em locais de difícil acesso e por muitas vezes ficam esquecidos pelo poder público. Portanto, o projeto é de suma importância — explica Pereira.

 

Texto: Jéssica Leal
Veja mais fotos da ação aqui.



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