Regina e Simone: irmãs se reencontram após quase 40 anos

 

Após 38 anos separadas, as irmãs Simone e Regina receberam o melhor presente de fim de ano: a confirmação do vínculo sanguíneo. Parece roteiro de filme, mas a história aconteceu bem aqui no Rio de Janeiro. As duas foram abandonadas pelos pais enquanto ainda eram bem novinhas, aos 4 e 6 anos de idade, e acabaram sendo adotadas por famílias diferentes, perdendo totalmente o contato. 

Mesmo após a adoção, Simone nunca perdeu a vontade de achar a sua família biológica e seguiu tentando preencher as lacunas dessa história. O reencontro das duas aconteceu este ano, em agosto, quando Simone resolveu contar a sua jornada de vida num grupo de pessoas desaparecidas no Facebook e a publicação acabou chegando até Regina. 

A separação das duas aconteceu muitos anos atrás, quando Regina decidiu ficar em casa enquanto a mãe das meninas, conhecida como Bernadete, levou Simone para ajudá-la a encontrar alimentos nas ruas da cidade, mais especificamente em São Cristóvão. Nenhuma das duas lembra muito bem o que aconteceu naquele dia, mas foi a última vez em que elas tiveram contato com a mãe. Simone se perdeu de Bernadete  e foi levada  a um abrigo por uma senhora que a encontrou vagando pelas ruas do bairro. 

Depois que nenhuma das duas, mãe  e filha,  retornaram para casa, Regina, aos 6 anos de idade, ficou sozinha  e foi adotada por uma vizinha.  Passou a vida esperando pela volta de sua família,  e se sentia culpada por não ter ido junto naquele dia. Enquanto sua irmã Simone passou algum tempo em um orfanato até ser finalmente adotada.

— Depois de muitos anos, eu finalmente decidi dar entrada no meu processo de adoção e ali eu consegui algumas informações básicas sobre as minhas origens. Naquele momento, eu decidi que queria encontrar a minha mãe biológica e tive a ideia de compartilhar a minha história em vários grupos de pessoas desaparecidas no Facebook, na esperança de que pudesse encontrá-las novamente. A surpresa veio quando uma vizinha da minha mãe viu a publicação e entrou em contato com a minha irmã Regina. Até então, eu nunca imaginava que isso pudesse realmente acontecer — explica Simone. 

A notícia também pegou Regina de surpresa. A irmã mais velha conta que estava em casa quando recebeu uma mensagem dizendo que alguém estava procurando a mãe com uma história muito parecida com a dela. Alguns dias depois e muitas mensagens trocadas via rede social, as duas irmãs finalmente se reencontraram pessoalmente e a conexão foi instantânea, algo sem explicação, segundo Regina. A partir dali, as duas já passaram a conviver em família, antes mesmo de qualquer confirmação de vínculo de parentesco que atestasse  que elas eram realmente irmãs.

A confirmação de uma suspeita forte

A história chegou até a Defensoria no início de outubro, por meio do Núcleo de DNA,  através da solicitação do Tribunal de Justiça, que solicitou parceria com a Defensoria no caso, pois sabiam que o exame,  realizado pelo Núcleo, teria celeridade na entrega do laudo.  

O exame de DNA das duas irmãs foi feito no dia 7 de outubro de 2021. A coleta foi realizada com muita emoção, pois as duas acreditavam muito no resultado positivo. E aconteceu como elas queriam. Entre abraços apertados e muitas lágrimas, as duas, enfim, puderam dizer “somos irmãs!”. 

— Depois que a minha mãe e minha irmã desapareceram, eu fiquei em casa esperando elas voltarem, mas isso nunca aconteceu. Foi muito difícil para mim. A gente vai seguindo a vida, mas eu nunca deixei de pensar nelas. Encontrar a minha irmã depois de todos esses anos é o maior presente que eu pude receber! Hoje nós ganhamos uma nova oportunidade de construirmos uma história com um final feliz — diz Regina emocionada.

Para a Coordenadora do Núcleo de DNA, Andreia Cardoso, que acompanhou a história desde o início, o caso das irmãs é emblemático.

— Nós da equipe de DNA trabalhamos com essas emoções, atendemos pessoas de todo o Rio de Janeiro que chegam cheias de esperança  e insegurança. Aqui tentamos estabelecer um atendimento afetivo  e acolhedor, pois se trata da vida da gente. Muitas pessoas chegam com vergonha, vivemos em uma sociedade machista, tentamos mostrar para elas que buscar as origens e estabelecer um vínculo genético afetivo é direito de todos. Afinal de contas, estamos na Casa da Cidadania. O nosso atendimento é feito todo com a perspectiva  de desconstruir essa ideia de valor moral. Procurar  a Defensoria Pública  para  a realização de um exame de DNA de investigação de paternidade, maternidade  e vínculo genético de parentesco é direito de todos. Para as crianças o direito à paternidade está previsto no ECA e  garantido na Constituição. Então, cabe  a nós fazer cumprir esse direito. Podemos garantir que esse trabalho está sendo feito com muito respeito e acolhimento e eu como coordenadora do Núcleo de DNA me orgulho muito disso - diz Andreia. 
 
Mais de 200 exames na pandemia

Mesmo durante a pandemia da Covid-19, o Núcleo de DNA da DPRJ realizou mais de 200 exames, promovendo o reencontro de diversas famílias. Localizado no Fórum Antigo da Leopoldina, em Olaria, o Programa oferece de forma gratuita, desde 1996, exames in vivo e post mortem para investigação de paternidade, maternidade, retificação de óbito e comprovação de vínculo genético de parentesco, visando a garantir o direito de cidadania através da informação de origem paterna/materna.

— O mais legal do programa é que não é preciso judicializar. Esse é um caminho que a princípio não tem processo, então a própria(o) assistida(o) pode resolver a sua situação. Tem dado muito certo dessa forma, o percentual de busca aumentou muito e a gente tem visto um resultado muito positivo, principalmente nos casos de registro de parentalidade — explica Andréia.

— Nosso principal objetivo é garantir o direito à cidadania através da informação de origem materna e paterna, e também dos laços biológicos. Os agendamentos no Núcleo podem ser feitos pelos Núcleos de Primeiro Atendimento da DPRJ, pelo 129 ou pelo aplicativo Defensoria RJ — reitera a coordenadora de Programas Institucionais da Defensoria, Carolina Anastácio.


Reportagem: Jéssica Leal



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