Os defensores públicos do Rio de Janeiro Pedro González, do Núcleo de Atendimento à Pessoa com Deficiência (NUPED), e Rodrigo Azambuja, coordenador de Infância e Juventude da Defensoria Pública do Rio participaram ontem (23) da audiência pública realizada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 6590, apresentada na Corte, contra o Decreto 10.502/2020, que instituiu a Política Nacional de Educação Especial. A norma, assinada pelo presidente Jair Bolsonaro, determina que governo federal, estados e municípios devem oferecer “instituições de ensino planejadas para o atendimento educacional aos educandos da educação especial que não se beneficiam, em seu desenvolvimento, quando incluídos em escolas regulares inclusivas e que apresentam demanda por apoios múltiplos e contínuos”. A ADI questiona os termos do decreto, considerado segregacionista por subverter a lógica da educação inclusiva.

O defensor Pedro González afirmou que o Decreto 10.502/2020 é inconstitucional. Ele destacou que a existência de dois sistemas de educação contraria a Convenção da ONU sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, que prevê a implantação progressiva da educação inclusiva como único modelo admissível.

- A sociedade é corresponsável pela inclusão das pessoas com deficiência. Não se trata mais de exigir que a pessoa se adapte, porque ela “atrapalha”, mas sim que a sociedade elimine as barreiras para a inclusão. A escola, como ambiente de aprendizagem que é, deve refletir a sociedade em toda a sua diversidade. Deve incluir, portanto, as pessoas com deficiência. Todas as deficiências. É somente com o convívio com a diferença que pode haver a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, sem preconceitos e discriminação como o capacitismo - disse Pedro durante a audiência. 

O defensor Rodrigo Azambuja apresentou a análise orçamentária dos recursos destinados à Educação na cidade e no Estado do Rio de Janeiro, que por sua vez concentram os maiores números de matrículas em comparação a outras regiões. No município, cerca de 3% dos 640 mil alunos são da Educação Especial, mas apesar da expressiva marca, somente 1% do orçamento gasto em 2020 foi destinado ao tema. Já no Estado, dos R$3,7 bilhões investidos, somente R$ 60 mil foram destinados à Educação Especial. 

- Os dados apresentados revelam um subfinanciamento crônico que, ao nosso ver, é uma das falhas para a adoção do modelo inclusivo. As falhas desse modelo ética, jurídica e moralmente sustentáveis se corrigem então com mais financiamento para que as barreiras atitudinais, sociais e físicas sejam superadas através de adaptações razoáveis. Gostaria de enfatizar, para concluir, que o MEC se baseia em falsas premissas de que alunos da educação especial atrapalham ou não podem conviver com os outros, e isso não é verdade. O modelo inclusivo permite, com mais investimentos, que essas barreiras sejam superadas - afirmou Azambuja.

Em dezembro do ano passado, o ministro Dias Toffoli, relator da ação, atendeu suspendeu o decreto. A suspensão foi mantida pelo plenário que, agora deve julgar o mérito do caso. Ao abrir a audiência desta segunda no STF, Toffoli destacou que o objetivo é avaliar o impacto da medida na concretização da inserção das pessoas com deficiência nas diversas áreas da vida em sociedade.

“Vamos refletir sobre qual deve ser o papel das escolas especiais e das classes especializadas na formação de pessoas com deficiência, tendo em perspectiva a educação inclusiva”, afirmou o ministro. 

A favor da educação inclusiva

Desde 2016, tramita na Defensoria Pública do Rio um Procedimento de Instrução, que visa a apurar as medidas práticas adotadas para garantir a implementação da educação inclusiva, como fornecimento de profissional de apoio escolar, pelas redes públicas de ensino do Estado e do Município do Rio. Naquele ano, foi realizada audiência pública na sede da Defensoria sobre o assunto, além de ter sido ajuizada, pelo Núcleo de Atendimento à Pessoa com Deficiência, uma Ação Civil Pública (ACP), em face do Município do Rio de Janeiro, em curso na 1ª Vara da Infância e Juventude e Idoso da Capital, em razão da falta de fornecimento adequado de profissionais de apoio escolar na rede regular de ensino municipal.

Somente no último ano, de junho de 2020 a junho de 2021, a Defensoria atendeu mais de 30 famílias que tiveram negado o seu direito ou interrompido o fornecimento de profissionais de apoio escolar (também chamados de mediadores escolares) para seus filhos com deficiência nas redes regulares públicas de ensino. Nos últimos cinco anos, 85 processos sobre o tema tiveram decisão de mérito na 2ª instância. Desse total, 72 foram ajuizados pela Defensoria.



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