“Eliete viveu pouco, mas viveu intensamente. Ela foi uma pessoa bastante feliz, tanto na família quanto na Defensoria. Essa solenidade vai perpetuar esse momento para nós. Quero que meus netos saibam quem foi sua mãe e tenham orgulho. Daqui a 20 anos, quem sabe, se vivo, estarei assistindo a posse de um neto meu como defensor público do Rio de Janeiro. É um sonho meu.”

Foi dessa maneira que o processualista e promotor de Justiça Afrânio Silva Jardim terminou sua fala no seminário que homenageou sua filha, a defensora pública Eliete Costa Silva Jardim, que faleceu em agosto de 2014. Promovido pela Administração Superior e pelo Núcleo de Terras e Habitação da Defensoria, com apoio do Centro de Estudos Jurídicos (Cejur) e da Fundação Escola Superior da Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro (Fesudeperj), o evento aconteceu na sexta-feira (11) no auditório da Sede e foi marcado pela emoção dos presentes, que recordaram passagens e atuações da defensora na instituição.

Mediando a atividade, o 2º subdefensor público-geral, Rodrigo Pacheco, leu o discurso que Eliete fez no encerramento do seu mandato no Conselho Superior, em dezembro de 2013: “Não acredito em uma Defensoria que abdique de suas próprias prerrogativas e dos direitos de seus assistidos, que não lute, com todas as suas forças, por sua autonomia e pela concretização de conquistas alcançadas na lei”.

 

Homenagens e lembranças

Ex-estagiária do Núcleo de Terras e Habitação (Nuth), Mariana Medeiros recordou algumas passagens da defensora e aprendizados que teve durante o período. “Foi essa experiência no Nuth que me engrandeceu muito, em que aprendi a construir e trabalhar de forma horizontal. Não me lembro da Eliete desanimada, pelo contrário, ela sempre estava com muita energia e tratava a todos com afeto”.

Em sua fala, Rômulo Souza de Araújo, membro do Conselho Superior da Defensoria ao lado de Eliete no biênio de 2012 e 2013, lembrou a participação da defensora no Conselho, destacando sua aptidão à função e seu papel de aproximação com a categoria: “Ela queria ser defensora e levava isso como uma profissão de fé, como uma forma possível para que as coisas fossem melhores. Para ela, sempre foi possível ter um sistema de justiça que protegesse a quem mais precisa”.

Em seguida, Pedro Carrielo, presidente da Fesudeperj, contou como convenceu Eliete a ser candidata substituta do Conselho e afirmou: “A chance de ter caminhado com ela, de ter participado do seu sorriso, saber que tínhamos pessoas com a qualidade dela, isso tudo me deixa muito feliz e me estimula”.

Já o 1º subdefensor público-geral, Jorge Bruno, destacou a atuação de Eliete na área criminal e suas habilidades: “Era uma estagiária brilhante. Já via nela uma sensibilidade social muito importante e uma análise diferenciada sobre o sistema punitivo”.

“Ela tinha uma redação e um português perfeito. Além disso, era uma pessoa altamente combativa”, afirmou o defensor Francisco Bastos Viana, que teve Elite como estagiária. Viana contou que Eliete tinha sido a primeira colocada no concurso para defensora, mas que, por querer antecipar a nomeação, foi para o último lugar e, portanto, teria que se deslocar aos lugares mais distantes do Rio: “Não tem problema, minha filha vai comigo”, respondeu à época.

A presidente de Adperj, defensora pública Maria Carmen de Sá, entregou ao pai de Eliete, Afrânio Silva Jardim, DVD's com todas as participações da defensora nas reuniões do Conselho Superior. 

 

Prêmio Eliete Costa Silva Jardim

Atual corregedora da Defensoria, Eliane Aina falou sobre o Prêmio de Práticas Exitosas Eliete Costa Silva Jardim, que será promovido pelo Cejur. “Será fundamental para mostrar que temos que lutar incansavelmente pela construção da Defensoria”. Diretora do Cejur, Adriana Britto explicou que serão premiadas iniciativas de defensores públicos do estado do Rio.

O defensor público-geral do Rio, André Castro, ressaltou a luta pela construção de uma instituição da qual Eliete foi protagonista, e destacou “a possibilidade de poder trabalhar em algo em que realmente se acredita e mudar de fato a vida de tantas pessoas que precisam da Defensoria. Essa é a nossa luta”.  E finalizou: “Eliete estará sempre viva conosco!”.

Ao final, a família foi condecorada com uma réplica da placa em homenagem a Eliete que foi afixada na sala do Conselho Superior. A peça traz o trecho do discurso proclamado pela defensora no encerramento de seu mandato no Conselho.

 

Primeiro bloco do Seminário debateu direito à moradia, tema em que Eliete se destacou

Antes das homenagens à defensora Eliete Costa Silva Jardim, aconteceu o debate “Desafios para a eficácia do direito humano à moradia adequada”. O encontro teve como gancho a primeira Ação Civil Pública (ACP) do Núcleo de Terras e Habitação (Nuth), e que teve Eliete como uma das autoras. O objetivo da ACP era dar uma solução de moradia para cerca de 70 famílias que haviam sido despejadas de um prédio privado. A defensora despachou com o juiz e obteve liminar favorável, garantindo aluguel social para aquelas pessoas.

O professor universitário e assessor popular Miguel Baldez abriu a discussão e discorreu sobre a criação do Nuth da Defensoria Pública. Também procurador do Estado, Miguel Baldez afirmou que o trabalho no Nuth era desenvolvido em conjunto com os assistidos.

“A Defensoria Pública trabalhava as necessidades individuais e nós tínhamos que trabalhar também os movimentos populares. Tive o prazer de encontrar a Eliete no Núcleo após ter sido professor dela na faculdade por três períodos. Estou muito feliz por estar hoje na Defensoria Pública e participar dessa homenagem”, disse.

Em seguida, a coordenadora do Programa de Direitos Humanos da FFord e colaboradora da Clínica de Direitos Fundamentais da UERJ, Letícia Osório, falou sobre a necessidade de implantação do direito à moradia pelo governo com o máximo de recursos disponíveis.

“A moradia tem vários componentes. Não é só ter quatro paredes. É preciso ter posse, disponibilidade de serviços, custo acessível, além das questões da habitalidade e da adequação cultural”, ponderou.

O morador removido da comunidade Vila Recreio II Jorge Santos lembrou com muito carinho da atuação de Eliete Jardim no Núcleo de Terras. “A Eliete era quietinha, mas trabalhava com muito afinco. Ela nos dava a oportunidade de construir o nosso processo de defesa”, disse.

Segundo ele, a moradia popular não pode ser mercadoria e enquanto assim for tratada, não terá solução: “O sistema Judiciário vai perder tempo discutindo algo que é considerado um direito natural”, disse.

A defensora pública titular do Nuth, Maria Lúcia de Pontes, encerrou a primeira parte do Seminário ressaltando a criação do Núcleo e a atuação de Eliete. “A Eliete construiu esse trabalho de criação do Nuth com a gente. Nós tínhamos que tirar o direito do papel e fazê-lo entrar na vida das pessoas. Nosso desejo era acabar com a discussão de posse e propriedade. Queríamos falar sobre o direito à moradia e, atualmente, falamos com muito mais tranquilidade", disse emocionada.  



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