A Defensoria reiterou que o dever de garantir acesso à saúde é primordialmente do Poder Público

 

A pedido da Defensoria Pública de Piraí, no Sul Fluminense, a 10ª Câmara Cível determinou que o Estado e o Município garantam, de imediato, tratamento para controle de transtornos neurocomportamentais a uma criança de sete anos, sem a necessidade de comprovantes adicionais sobre a situação financeira da família. O Juízo da comarca havia condicionado a apreciação do caso à entrega de documentos que atestassem serem os rendimentos do núcleo familiar (pai e mãe) da menina insuficientes para a compra dos medicamentos. 

— Não é a primeira vez que o juízo local quer exigir comprovação de renda para ações de medicamentos, por entender que a obrigação do Estado é subsidiária à da família e destacando a crise financeira vivida pelos entes públicos. Tal posicionamento não se sustenta, pois a insuficiência se extrai das circunstâncias do caso, especialmente quando patrocinados pela Defensoria  — explica o defensor público William Akerman.

E prossegue ele:

— Ademais, exatamente nos momentos de crise é que os cidadãos mais precisam das prestações estatais, que devem ser fornecidas regular e imediatamente. E a Constituição assinala que a saúde é direito de todos, sendo o mais universal dos ramos da seguridade social. Não há disposição jurídica que subtraia a obrigação dos entes públicos de fornecer as prestações de saúde em função da renda do munícipe ou de sua família, notadamente quando envolve criança, que, pela condição peculiar de pessoa em desenvolvimento, goza de absoluta prioridade

O desembargador relator acatou os argumentos do defensor público: “A necessidade do fármaco, diga-se, encontra-se devidamente estampada no atestado médico”, destaca o acórdão, que ressalta ainda que a garota é patrocinada pela Defensoria, “reside em localidade notadamente de baixa renda na cidade de Pirai” e já fora contemplada com gratuidade de justiça. 

“Outrossim, a autora é menor de idade, condição protegida com primazia pela Carta Magna, e que encontra respaldo no Princípio da Proteção Integral à Criança e ao Adolescente “, resumiu o desembargador, ao dar provimento ao recurso impetrado pelo defensor público, desconsiderando a imposição de comprovante de renda familiar e determinando, em caráter liminar, que o Estado do Rio de Janeiro e o Município de Piraí “forneçam à parte autora os medicamentos requeridos na inicial, bem como outros de que venha necessitar, ou seus substitutos similares, no prazo de 05 dias” a contar de notificação oficial.  

No final de agosto, a mãe da criança procurou a Defensoria Pública de Piraí para pleitear que o Poder Público assegurasse à menina tratamento para Transtorno Opositivo Desafiador (TOD) e Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH). A Defensoria apresentou, então, ao Juízo Único de Piraí, pedido de tutela de urgência para fornecimento dos medicamentos prescritos em laudo médico. 

A juíza, porém, proferiu decisão interlocutória com a exigência de que “comprove a parte autora a composição e renda do seu núcleo familiar, pois a genitora é casada e nada é mencionado na petição inicial a respeito do salário do genitor. A obrigação em tela é primordialmente da família”.

— Não faria sentido que eu solicitasse à família a apresentação de novos comprovantes de renda, postergando o atendimento do pleito de urgência. Opus embargos de declaração, que, porém, foram desprovidos pelo Juízo da comarca.  Interpus, então, agravo de instrumento, com pedido de efeito suspensivo ativo, de modo a reafirmar que a obrigação é sempre do Estado e não deve o assistido se desincumbir de mais esse ônus quando já evidenciada a hipossuficiência, entendimento corroborado pelo desembargador relator —conclui Akerman.

 


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